Resenha do artigo “Social decision making in autism: On the impact of mirror neurons, motor control, and imitative behaviors” de Khalil, Tindle Boraud, Moustafa e Karim (2018).
Pouco nos perguntamos sobre os controles das nossas ações e quais são as responsáveis por elas. É perceptível que agimos de maneira automática com o fim de economizar energia, seja na produção de dúvidas ou na busca por respostas. Além do automático, produzimos esquemas cognitivos para gerar comportamentos propositais. Porém, indivíduos diagnosticados com transtorno de espectro autista, em seus desenvolvimentos e até as suas idades adultas, demonstram comportamentos peculiares. Poderia haver correlações neurais para essas especificidades comportamentais no autismo?
O artigo “Social decision making in autism: on the impact of mirror neurons, motor control, and imitative behaviors” conceitua o espectro autista como um transtorno no neurodesenvolvimento e que implica numa diminuição dos comportamentos sociais e em um aumento de comportamentos repetitivos e estereotipados. Os autores colocam que desde cedo já se verificam prejuízos na atenção ou reconhecimento de rostos, vínculos sociais e comportamentos motores por conta de áreas neurais afetadas, como o tronco cerebral, cerebelo e o córtex, por exemplo.
Ao comparar os comportamentos de crianças diagnosticadas com transtorno de espectro autista (TEA), com retardo mental e com desenvolvimento normal através de gravações dos primeiros aniversários dessas mesmas crianças, é depreendido que os autistas apresentam menos envolvimento social em comparação às crianças com retardo mental, orientando-se pouco para as pessoas ao entorno. Além disso, tanto as crianças autistas como as crianças com retardo mental deram pouca importância aos objetos que estavam sendo segurados por terceiros, verificando-se o oposto em crianças com desenvolvimento normal.
Com a apresentação de estudos anteriores, nota-se que há a ativação de alguns neurônios na área F5, ou seja, no córtex pré-motor, tanto na realização de uma ação como na observação dessa mesma ação realizada pelos outros. Ou seja, os neurônios ali presentes se ativam quando observamos um comportamento e quando geramos um comportamento similar ao observado. É como se houvesse, dessa forma, uma repetição mental das ações realizadas por outrem, podendo ser inferido uma similaridade com a imitação ou preparo ao aprendizado.
Nos estudos com TEA, observa-se que há um comprometimento nas ativações dos neurônios espelho, contribuindo para o entendimento de que as inibições sociais desses indivíduos e seus comportamentos específicos podem se relacionar com essa área neural. Vale salientar que, a partir dos estudos colocados no artigo, os neurônios espelho desses sujeitos são mais sensíveis para aquilo que é desconhecido do que para o que é próprio ao seu repertório, demonstrando uma possível relação do aprendizado com esses neurônios.
Além do mais, é abordado com diagnóstico de TEA reconhecem ações motoras feitas por outras pessoas, mas com dificuldades no entendimento das motivações dessas ações, especificando a temática do artigo. Os autores exibem estudos onde ocorrem estimulações de áreas motoras em sujeitos sem TEA e com TEA a fim de evidenciar correlações entre os neurônios presentes nessas localizações e aos comportamentos manifestados pelos portadores do espectro autista. Certamente que o processo de entendimento das ações não é exclusividade dos neurônios espelho, mas sim de uma rede de processos neurais.
Porém, a vertente neurobiológica clarifica que nos sujeitos com TEA, há anormalidades na amígdala, no córtex pré-frontal, no sulco temporal superior e no giro fusiforme, onde trazem problemas funcionais, sendo esse mesmo conjunto de lugares neurais o chamado: cérebro social. Outro aspecto é que tanto participantes com TEA quanto os sem TEA, a partir dos estudos no apresentado no artigo, geram imitações voluntárias. Mas, do contrário, quanto à imitação ou resposta às mesmas emoções suscitadas por outrem, os participantes com TEA não tiveram a evocação da imitação automaticamente.
Verifica-se, então, que o trabalho neural é múltiplo, mas, nas relações com os aspectos sociais, uma primeira camada seria a do mecanismo dos neurônios espelho. A combinação entre os paradigmas comportamentais dos portadores de espectro autista e as mensurações neurofisiológicas apresentadas desses sujeitos, uma vez que cada uma dessas intervenções demonstram correlações promissoras. Dessa forma, mediante os autores, o estudo desses dois ramos supracitados, combinados, podem conceder o conhecimento de subgrupos e, logo, o encontro de tratamentos mais eficazes.
Definindo Conceitos Importantes
Tronco cerebral: É a porção craniana do sistema nervoso central segmentar, relacionada ao estado desperto e de vigília.
Cerebelo: Repousa sobre a fossa cerebelar do osso occipital e está relacionado com o equilíbrio e a coordenação dos movimentos.
Córtex: É dividido em três tipos de cortes: arquicórtex, paleocórtex e neocórtex […] para a elaboração de mapas corticais, havendo alguns que chegam a comportar mais de 150 áreas corticais.
Transtorno de Espectro Autista: Transtorno do neurodesenvolvimento onde as manifestações que caracterizam seu contexto sintomático são basicamente comportamentais e qualitativas, relacionadas à dificuldade na interação social e na comunicação.
Retardo mental: Condição de desenvolvimento interrompido ou incompleto das capacidades mentais […].
Neurônios Espelho: Neurônios envolvidos nos processos que empregam a imitação como recurso de aprendizagem motora.
Referências Bibliográficas
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Ficha Técnica
Texto da resenha: Ramon Santiago do Nascimento
Edição e revisão técnica: Luã Teixeira Guapyassú Câmara / Danielle Paes Branco